Um século de vida dos CTT em Alvalade

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A história dos CTT em Alvalade começa no dia 23 de Agosto de 1914, com a inauguração da Estação de Telégrafo-Postal, no início da rua de Lisboa e defronte da Praça D. Manuel I, ocupando um espaço sagrado, que outrora acolheu a capela do Espírito Santo. O dia teve festa rija e convidados ilustres. Não era para menos, já que na mesma data era também oficialmente inaugurado o primeiro troço da linha ferroviária do Sado e a iluminação pública de várias ruas da vila. O Padre Jorge de Oliveira, num dos seus muitos artigos sobre a vida Alvaladense, descreve-nos, com pormenor, como a vila viveu esses dias:

“(…) foi, profusamente, distribuído um programa que dizia: “Alvalade – Grandiosos Festejos nos dias 22 e 23 de Agosto, por ocasião da inauguração da linha férrea do Vale do Sado, Estação do Telégrafo-postal e iluminação pública, e que constarão do seguinte: Dia 22 de Agosto, música, tourada, inauguração da iluminação pública e quermesse. Dia 23 de Agosto, alvorada, inauguração da Estação do Caminho de Ferro e Estação do Telégrafo-postal, quermesse, concerto musical, iluminações e fogos de artificio”. Quem, nesses dias, entrasse em Alvalade, pelo lado de Campilhas, encontrá-la-ia em festa: as ruas de Lisboa, 31 de Maio e Duque da Terceira, embandeiradas, e sob um túnel de arcos, ornamentados com balões venezianos e com os escudos de diferentes concelhos do Alentejo. O pavimento apresentava-se atapetado de espadana e murta. A Praça D. Manuel I, centro para onde convergem as diferentes artérias da vila, destacava-se com o seu coreto, e, junto ao pelourinho, avultava a barraca do bazar.  No dia 22, tinha-se realizado uma tourada e fizera-se a inauguração da iluminação pública por meio de acetilene, e grande parte da noite gastara-se a admirar o brilho das luzes, os prémios do bazar e os trechos da música, intervalados pelos foguetes luminosos, que faziam escancarar as maxilas aos transeuntes… No dia 23, às 9 horas, ainda muitos dormiam a sono solto, e já a banda dos bombeiros de Beja excitava a indolência dos habitantes, com uma marcha viva e alegre, chamando-os, apressadamente, para fazerem as honras aos hóspedes e forasteiros, que nos vinham visitar, e que não deveriam demorar muitos minutos. Posto tudo em movimento, seguiram para a Estação dos Caminhos de Ferro de Alvalade, cuja inauguração ia fazer-se com a entrada do primeiro comboio, que vinha da Funcheira, com passageiros e deveria chegar a Alvalade às 9.30. Às 11 horas já todos se encontravam na vila, para se fazer a inauguração da Estação do Telégrafo-postal. Estávamos em maré de inaugurações. Ao meio-dia, as autoridades do concelho e da freguesia, levando à sua frente o prestigioso deputado Sr. Jorge de Vasconcelos Nunes, a quem se deve tão grande melhoramento, entraram na nova estação, inaugurando-a, fazendo expedir os primeiros telegramas ao Chefe de Estado, ao Ministro do Interior, ao Governador Civil e aos amigos. Entretanto, o bazar reforçava a sua reserva de prendas, e a filarmónica chamava os forasteiros para nova tourada, que ia realizar-se no Largo do Adro. Às 21 horas, a banda dos bombeiros subia ao coreto e encetava o concerto musical, ouvido com geral agrado, e parte do povo espalhava-se pelas ruas, profusamente iluminadas, admirando o efeito, na verdade empolgante. Às 23, no Largo da República, queimava-se um aparatoso fogo de artifício, em 6 quadros, representando, um deles, a chegada do comboio a Alvalade, o que entusiasmou, sobremaneira, os assistentes. Pouco depois, Alvalade adormecia, sob o peso de tão violentas emoções, e só acordou, no dia seguinte quando o despertador do Morse lhe anunciou os primeiros telegramas de felicitações, e o silvo da locomotiva lhe chamou à atenção para as primeiras malas do correio, para os jornais desse dia, e para as primeiras mercadorias, que lhe vieram abastecer o mercado… E Alvalade, que sempre apertada pelo cinto de Campilhas e do Sado, despertou envolvida na torrente transformadora, que a chamava a uma vida nova“.

Em 27 de Dezembro de 1941 foi desmontado o telégrafo na Estação de Telégrafo-Postal e montada uma cabine telefónica, que abriu ao serviço no mesmo dia.

Em Janeiro de 1943, a Estação de Telégrafo-Postal foi renovada e transferida da rua de Lisboa para a rua de S. Pedro, onde iria permanecer meio século.

No dia 22 de Outubro de 1999, é inaugurada a nova estação dos CTT, no nº 19 da rua Duque da Terceira.

Ao longo de quase um século, parte importante da vida da freguesia foi entrando e saindo pelas portas da estação de correios, ao ritmo do seu pulsar diário. O dia 12 de Abril de 2013, fica registado como um dos dias mais negros da história de Alvalade. Nesse dia não se encerrou apenas uma estação de correios. É também parte do estatuto e da autonomia da freguesia que desaparecem.

_LPR

Agradecimento: Ao Arqº Francisco Lobo de Vasconcellos pela cedência da fotografia, proveniente do arquivo de família. A imagem, datada de Dezembro de 1936, mostra a Estação de Telégrafo-Postal na rua de Lisboa, devidamente identificada e onde se pode observar o poste com a linha do telégrafo na frontaria do imóvel.

8 Respostas a Um século de vida dos CTT em Alvalade

  1. José Raposo Nobre   16 de Abril de 2013 at 15:18

    Só posso dizer, excelente, Dr. Luis Pedro, os elementos que conseguiu para historiar os CTT na nossa vila.
    Os tempos mudaram e agora a Empresa que trabalha apenas numa redução de custos, sem qualquer respeito pela História, para se seguir a privatização dum serviço nacional, tal como a Água, a Eletricidade ou os Caminhos de Ferro e a TAP que deveriam continuar publicos.
    São questões politicas que não quero abordar por falta de elementos que nos levem a opinião justa.
    JRN

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  2. Maria Ângela de Atayde   16 de Abril de 2013 at 18:20

    Por razões de cidadania mas, sobretudo, por razões pessoais, nem sei dizer o quanto me entristece o encerramento dos CTT em Alvalade!

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  3. Maria Dores Carvalho Amado   16 de Abril de 2013 at 18:54

    Estou contigo, Gita. Que saudades dos tempos em que ia ao correio “pôr” as cartas, os cartões de B. Festas e depois, tb os aerogramas…..e qnt aos telefonemas ainda manuais e eu pedia…….se f favor, ligue- me para o 31…..o Monte da Vinha foi, no primeiro grupo de 50 onde foi feita a instalação….o café do Chico era o 8 e a casa da D. Adila Cebola o 26…..o correio era o 1 e a residência o 2…..sabia muitos n.os de cor, mas estes cabelos brancos foram apagando os mesmos….
    Mais um bocadinho da vida de Alvalade se apagou…..

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  4. Céu Bougron   16 de Abril de 2013 at 21:39

    Fico muito triste com este acontecimento;
    Aqui em França o problema é o mesmo. Muitas aldeias ficaram sem esse serviço público. Algumas estão de novo a abrir com um só empregado que faz a distribuição do correio de manhã e de tarde abrem ao público.
    Alvalade está numa má situação e isso é muito triste para todos.

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  5. Matilde Oliveira   17 de Abril de 2013 at 11:22

    Um bom texto mas muito triste ao mesmo tempo por terem fechado a estação dos CTT. Lamento bastante o sucedido e é pena porque o interior do país tem muitas riquezas por explorar.

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  6. José Raposo Nobre   17 de Abril de 2013 at 15:41

    Compreendo todas as reações, mas sobretudo da D. Ângela de Atayde.
    Na m/adolescência, a partir dos 14 anos fui empregado e escriturário do Agente Bancário, único nesta vila, e todos os dias ia ao correio enviar dinheiro em Vales. Criei uma amizade, recíproca, com a funcionária que ainda hoje recordo com saudade. Nesse tempo o Correio abria aos domingos de manhã, por vezes nos dias de semana não tinha tempo para a escrita bancária e prescindindo dos meus direitos, trabalhava no Domingo para cumprir os prazos que os Bancos exigiam e sempre a D. Maria Ângela atendia com amizade e respeito. Recordo-a sempre com emoção.
    JRN

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  7. Rosário Raposo   23 de Julho de 2015 at 20:10
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    • admin   23 de Julho de 2015 at 23:32

      Dª Rosário Raposo,
      Posso apenas sugerir que apresente as suas razões e reclamações no local certo, que certamente não será aqui. Com calma e ponderação tudo se resolve.
      _LPR

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