Só o grande lavrador, de um modo geral, dispõe do capital necessário para a labuta da sua casa agrícola, outro tanto não sucede ao de menores recursos, que nalgumas épocas do ano é obrigado a recorrer ao empréstimo. Contudo, nos últimos anos, devido a um sem número de factores contrários ao bem comum que têm surgido, a própria grande lavoura foi duramente atingida e lavradores com domínio de centenas de hectares forçados a pedir dinheiro emprestado, a fim de continuaem a amanhar devidamente as terras.
Ora, se os grandes assim sofrem os efeitos desastrosos da anormalidade em que se vive, que dizer dos pequenos! Cada dia que passa representa mais um degrau subido na escada do seu calvário de aflições, e os seus espíritos pouco feitos a cálculos matemáticos esforçam-se em lucubrações esfalfantes, para achar o “x” do pão nosso de cada dia.
Quem empresta o dinheiro são os bancos, a Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência, a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Santiago do Cacém e os capitalistas da freguesia e arredores. Os juros são variáveis, assim como as garantias, que vão da simples letra à hipoteca das propriedades. A taxa daqueles tem baixado nos últimos tempos, e hoje é geralmente de 5% para os estabelecimentos de crédito e 8 a 10% para os particulares, que ainda não há muitos anos exigiam juros de 20% e mais. Deve estar hipotecada 30% da propriedade rústica da freguesia.
O pequeno agricultor, por motivos especiais a que não é indiferente o seu feitio concentrado e pouco amigo de divulgar aos outros os segredos da sua vida, prefere, na maioria dos casos, os empréstimos particulares. O dinheiro pode ficar-lhe mais caro, mas a sua vida não sofre tão grande devassa, nem o atormentam tanto certos funcionários “doentes do fígado” com papéis e papelinhos que custam os olhos da cara. Se acrescentarmos àquelas despesas as inerentes a duas deslocações à sede do concelho, absolutamente indispensáveis, ver-se-à que para empréstimos pequenos o juro deixa de ser de 5% e passa para 8, 9 e 10%. É nomeadamente na altura da compra dos adubos, das sementeiras, e em especial das mondas e ceifas que mais se faz sentir a falta de dinheiro. O agricultor, chegadas essas alturas, vê-se ante o dilema de deixar as terras por cultivar e as searas por amanhar, ou então de recorrer aos empréstimos. O que faz em algumas ocasiões para se defender de pedir grandes quantias, é tratar as terras menos cuidadosamente e vender cereais e gados em más condições. Cai assim num círculo vicioso, de consequências funestas sob o ponto de vista agrícola, económico e social.
Duas idas a Santiago acarretam as seguintes despesas:
4 bilhetes de comboio a 7$90 = 31$60
2 refeições a 5$00 = 10$00
2 dias perdidos a 8$00 = 16$00
Total: 57$60
_António Luis Seixas Felix da Cruz in “A Freguesia de Alvalade”, 1941.
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