Após a Convenção de Évora-Monte, de 26 de Maio de 1834, dirigiu-se o príncipe destronado, de Évora para Sines, no dia 30, entrando na freguesia de Alvalade, pela carreteira da Herdadinha, à uma hora da tarde de 31, sob um sol tropical, escoltado pelo Regimento de Lanceiros da Rainha, comandado pelo Tenente Simão Infante de Lacerda.
Chegados a Alvalade, hospedou-se o régio exilado em casa do proprietário Luis da Lança Parreira, que, com sua esposa, D. Teresa Luísa da Lança Parreira, deram ao hospede o melhor acolhimento. Nessa casa, que ainda existe e é propriedade da família Felix, passou D. Miguel a última tarde e a última noite da sua permanência em Portugal. Na manhã do dia 1 de Junho, ao despedir-se dos seus atenciosos hospedeiros, duas lágrimas teimosas afloraram aos olhos do infeliz príncipe. Seria gratidão pela carinhosa hospedagem? Mágoa pelas afrontas recebidas? Seria o prelibar da nostalgia, da saudade gosto amargo dos infelizes, abutre, que começara a devorar-lhe o peito?
Seria tudo isso, porque nessas horas dolorosas, tudo sentem as almas atribuladas…
Chegaram, pelas 5 da tarde, a Sines, aonde eram esperados por dois navios de guerra, ingleses, a fragata Stag e a corveta Nenod, que salvaram, no acto do embarque.
E, quando ao escurecer, o régio exilado, debruçado na amurada da Stag, contemplasse as águas serenas da baia e a dentadura carcomida do castelo, por certo diria como o nosso grande épico:
Esta e a ditosa pátria minha amada
A quasi o Céu me dá que eu sem perigo
Torne com esta empreza já acabada
Acaba-se esta luz ali consigo
(Lusíadas, Canto III. Est. XXI)
Mas não tornou, não mais viu o sol brilhante de Portugal, e a luz extingui-se-lhe em terra estranha, a mais bronca jazida, a mais fria sepultura para um peito português.
Na referida casa, com a precipitação da retirada, deixou o Senhor D. Miguel uma espada, que o célebre miguelista Remexido ali mandou buscar, algum tempo depois, e uma faca com o cabo de prata, oitavado, já gasto, com as iniciais R.F. encimadas pela coroa real, que a família Albino, de Messejana, guarda como recordação dos acontecimentos.
Foi para perpetuar este facto histórico, que a Junta de Freguesia de Alvalade propôs, em sessão de 1 de Maio de 1925, e o Senado Municipal de Santiago do Cacém aprovou, por unanimidade, que a Rua da Estalagem, aonde se encontra a referida casa, passasse a denominar-se Rua 31 de Maio de 1834.
_Apontamentos históricos do Padre Jorge de Oliveira (1865/1957), pároco de Alvalade entre 1908 e 1936, para uma monografia que não chegou a publicar.
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