Em 1702 o Padre Beneficiado da Matriz de Alvalade Miguel Nunes Lobo pede, e é-lhe concedido, o alvará de dispensa do benefício curado bem como a autorização para regressar a casa de sua mãe, em Azinheira dos Barros. O benefício eclesiástico vagante é então conferido ao Frei professo da Ordem de Santiago João Camacho de Brito. Nesta Paróquia o novo beneficiado permanecerá quase três anos, entre 1702 e 1705, coadjuvando o Prior João Vaz Picheiro. Mas atenção, as suas funções eclesiásticas tanto eram exercidas na Igreja de Nossa Senhora da Oliveira, em Alvalade, como na Capela de Nossa Senhora do Roxo.
Neste período verificamos que os beneficiados da Matriz e o seu prior asseguravam o acompanhamento espiritual das populações da Herdade do Roxo, facto esse testemunhado nos Registos Paroquiais onde eram inscritos os casamentos, os batizados e os óbitos realizados pelos clérigos que serviam a paróquia de Nossa Senhora da Oliveira.
Entre 1702 e 1705, a Matriz de Alvalade era servida por cinco padres beneficiados e um Prior, o que mostra bem a dimensão da paróquia e os meios económicos que as famílias mais notáveis dispunham. Falamos do Prior João Vaz Picheiro e dos Padres Beneficiados Antão de Oliveira Penteado, Bartolomeu Gomes Pinharanda, João Camacho de Brito, Manuel Afonso Machado e Nicolau Gonçalves.
As permanências na Capela de Roxo eram mais ou menos longas, como no caso de João Camacho de Brito em que as maiores estadias ao serviço de Deus e das populações aconteceram entre setembro e o início de dezembro de 1703 e a maior entre o mês de janeiro e o início de dezembro de 1704.
Em Julho de 1705 deixa definitivamente a condição de beneficiado da matriz de Alvalade, para se tornar prior da Igreja da Paroquial de S. Domingos, no concelho de Santiago do Cacém. Cargo que desempenhará até Abril de 1707 e cujo termo de apresentação assinala, como era hábito ao tempo, no livro de registo da paróquia de S. Domingos, nos seguintes termos:
“Aos nove dias do mês de Julho de 1705 anos tomei posse desta Igreja de S. Domingos termo de Santiago do Cacém”.
Nem o Padre João nem a sua família eram do concelho de Alvalade, aliás não há motivo aparente para o jovem freire aceitar um benefício numa paróquia longe da sua terra natal: Almodôvar. Talvez ele tenha seguido apenas uma das tendências, que desde há mais de 200 anos, vinha ocorrendo entre os filhos famílias daquela vila dos Campos de Ourique, isto é, desempenhar cargos administrativos, militares e religiosos por todo o Baixo Alentejo, alargando assim a influência das suas elites.
Não sabemos quando nasceu João Camacho de Brito, mas pensa-se que talvez por volta de 1680, quanto à data e ao local do falecimento nada sabemos. Aliás, a última notícia que temos do Padre João data do dia 8 de Abril de 1707, num registo de óbito.
João era filho de Domingos Coelho Camacho e de Joana Louçã de Brito, ambos de Almodôvar. Pela parte paterna era bisneto do Sargento-Mor de Almodôvar João Camacho Guerreiro e de Isabel Guerreiro de Brito e pelo lado de sua trisavó Maria Guerreiro de Aboim descendia de Estevão Vaz de Aboim, Senhor da Quinta de Monte-Rei e de sua mulher Leonor Guerreiro, Senhora do morgadio e Quinta dos Guerreiros.
Seu irmão Bartolomeu Gomes de Brito foi alferes de Infantaria do Regimento de Serpa e casou em 1716 com Ângela Gonçalves Montesa, de Aljustrel, filha do Capitão Estevão Guisado Raposo. É com este casal que no início do séc. XVIII os Camachos de Brito se instalam no concelho de Aljustrel, sendo um dos seus descendentes responsável por alterar a ordem dos sobrenomes dando origem à família Brito Camacho, cujo membro mais conhecido é o republicano, Dr. Manuel Brito Camacho.
Mas as relações familiares que marcam toda a região não terminam em Aljustrel… é que o Padre Miguel Nunes Lobo e o Padre João Camacho de Brito têm um primo em comum: Diogo Mestre de Brito, da família Nunes Lobo e administrador da Capela de S. João Batista na Igreja de Nossa Senhora de Azinheira dos Barros, cujo património mais importante se situa no então concelho de Alvalade.
Este caso do Padre João é paradigmático de um tempo em que para as populações o espaço geográfico se sobrepõe às determinações político-administrativas que dividem o território. As populações circulavam de acordo com os seus interesses quer pessoais quer familiares, isto é, casavam, viviam, compravam ou herdavam bens, procuravam trabalho, espalhavam relações familiares ou de compadrio, alargavam influências, onde bem lhes convinha. O espaço era assim uno e vasto que ia das margens do Sado às Serras de Santiago e Grândola, mas também aos Campos de Ourique e aos campos de Ferreira.
_Fernanda Freitas
Junho de 2019
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