Há cerca de 40 a 50 anos a maior parte do Alentejo estava em regime de charneca, e apenas se cultivavam os terrenos de várzeas, os destinados a arroz e pequenas cercas ou quinchosos na proximidade dos montes. Com a lei que valorizou o trigo, os proprietários abastados começaram a fazer a limpeza nos terrenos e no arvoredo e, os que não dispunham de meios para custear as despesas, davam as terras para limpeza a trabalhadores ou seareiros, em troca da lenha e de uma ou duas colheitas.
Foi assim que o Alentejo mudou de aspecto. O trabalhador rural afoitou-se, pedia dinheiro emprestado, vendia trigo ainda verde, vendia lenha, apanhava, comia e vendia a caça abundante que encontrava e, no fim, era copiosamente compensado, pois que a primeira e segunda colheitas eram soberbas, porque raramente ficavam abaixo de 40 a 50 sementes. Vendido o trigo em Agosto, era curioso ver o seareiro, em Setembro e Outubro, com o seu pedreiro e um servente, a bater taipa, empinar 4 paredes que em Novembro eram cobertas e rebocadas e no Inverno a seguir, já à roda da lareira, ele a mulher e os filhos se aqueciam com a lenha abundante da limpeza e, no meio da casa, lá avultavam as sacas grandes de palma que garantiam o pão o resto do ano porque estavam cheias de trigo cuidadosamente guardado para comer, para a sementeira e para acudir a alguma ocorrência traiçoeira.
Foi assim que o casario de Alvalade quase triplicou num espaço de pouco mais de 10 anos. Entregues as terras aos senhorios, os seareiros já aquecidos com o bem estar de alguns anos e com a experiência que os industriou em tais serviços, iam procurar e marcar terras onde as encontravam e não ficou pé de torga, urze, lentisco, aro ou esteva que a roçadora, o alferce ou a charrua não arrancasse. Como não havia mercado consumidor para tanta lenha, a que sobrava era amontoada e queimada e hoje só se encontram arbustos nas terras que estão de folga e que não podem resistir a uma constante cultura. Esses mesmos arbustos, em grande parte resinosas, são roçados e prensados como a palha e a cortiça, e vão servir para os fornos e acender o carvão das caldeiras a vapor. Assim, as terras limpas e desbravadas eram denominadas – terras novas.
A cultura predominante é a do trigo, seguindo-se a da aveia, do centeio e da cevada. Nas terras mais fortes semeia-se o grão-de-bico (Vale de Lobo) e nas várzeas também se semeia a fava. Nos terrenos arenosos semeia-se o milho, entremeado com melancias. Nos córregos e terrenos frescos semeia-se feijão-frade, melões, tomateiros e pepinos e já se cultivam também as batatas, couves e cebolas.
No arvoredo, composto de sobreiros e azinheiras encontra-se o rendimento da cortiça e a bolota e lande para a engorda dos suínos. A erva dos prados e o restolho das terras semeadas engordam numeroso gado vacum e lanígero, do qual se aproveita a lã e o leite para a indústria dos tecidos e lacticínios. O gado vacum é vendido para o talho, aproveitando-se algum para os trabalhos da lavoura. No tempo da charneca predominava o elemento caprino, havendo soberbos exemplares de chibatos capados que atingiam grande corpulência e davam boa e saborosa carne. Hoje, as terras da charneca, geralmente arenosas, carecem de largo repouso e, ainda assim, da adubação química, quando são semeadas.
_Apontamentos históricos do Padre Jorge de Oliveira (1865/1957), pároco de Alvalade entre 1908 e 1936, para uma monografia que não chegou a publicar.
Comentários recentes